O Governo Provisório de Vargas: características, economia e acontecimentos

O Governo Provisório de Vargas foi o regime instaurado entre 1930 e 1934, após a Revolução de 1930, no qual Getúlio Vargas assumiu o poder com autoridade centralizada e sem respaldo constitucional, com o objetivo de reorganizar o Estado brasileiro.

Getúlio Vargas é recepcionado no Palácio do Catete em 31 de outubro de 1930.
Getúlio Vargas é recepcionado no Palácio do Catete em 31 de outubro de 1930.

 

O que foi


O Governo Provisório de Vargas corresponde ao período inicial da Era Vargas, compreendido entre os anos de 1930 e 1934. Esse governo foi instaurado após a Revolução de 1930, que depôs o presidente Washington Luís e impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes. Getúlio Vargas assumiu o poder de forma provisória, sem respaldo constitucional direto, com a promessa de reorganizar o Estado brasileiro e convocar uma nova Constituição. Nesse período, Vargas concentrou poderes e iniciou uma série de transformações políticas, administrativas e econômicas que alteraram profundamente os rumos da República brasileira.




Contexto histórico


O Brasil, na década de 1920, vivia uma profunda crise do sistema político da Primeira República. Conhecido como República Oligárquica ou República do Café com Leite, esse sistema era caracterizado pelo revezamento no poder entre as oligarquias de São Paulo e Minas Gerais. Com a crise econômica mundial de 1929, houve uma queda acentuada na exportação de café, principal produto da economia brasileira, afetando diretamente os interesses da elite paulista.


O descontentamento social e político crescia, sobretudo entre setores urbanos, classes médias, militares jovens (como os tenentes) e oligarquias dissidentes, como a do Rio Grande do Sul. Em 1930, uma aliança entre esses setores, chamada Aliança Liberal, promoveu um levante armado que culminou na deposição do presidente Washington Luís e impediu a posse de Júlio Prestes. Vargas, então líder da Aliança, foi conduzido ao poder com amplo apoio civil e militar, instaurando um governo de exceção com o compromisso de reestruturação institucional.




Características do governo provisório de Vargas:


- Centralização do poder: Vargas assumiu com poderes amplos, dissolveu o Congresso Nacional, destituiu governadores estaduais e nomeou interventores, muitos dos quais eram civis ou militares ligados à Revolução de 1930.


- Supressão da Constituição de 1891: Com a deposição do antigo regime, a Constituição de 1891 foi suspensa, permitindo que Vargas governasse por decretos-leis, sem submeter suas decisões ao Legislativo.


- Intervencionismo econômico: o governo provisório adotou medidas de controle da economia, com destaque para o incentivo à industrialização, intervenção nos preços do café e criação de órgãos reguladores.

- Reorganização administrativa: Vargas promoveu mudanças na estrutura do Estado, criando ministérios e departamentos para atender às novas demandas sociais, como o Ministério da Educação e Saúde Pública.


- Valorização do trabalho urbano: houve o início de políticas voltadas às classes trabalhadoras, com a regulamentação de direitos como jornada de trabalho, férias remuneradas e descanso semanal, ainda que de forma inicial e estratégica.

- Nacionalismo e fortalecimento do Estado: o discurso nacionalista ganhou força, com valorização da autoridade estatal, incentivo à integração territorial e busca por uma identidade cultural e econômica própria.




Principais acontecimentos deste período:


- Nomeação dos interventores federais: após a deposição dos governadores, Vargas designou interventores para os estados, rompendo com a autonomia regional característica da Primeira República e concentrando o poder no Executivo Federal.


- Revolução Constitucionalista de 1932: movimento liderado por São Paulo que exigia o retorno à legalidade e a promulgação de uma nova Constituição. A revolta foi reprimida militarmente, mas resultou na convocação da Assembleia Constituinte em 1933.


- Criação de novas instituições: foram criados órgãos como o Departamento Nacional do Café (DNC) e o Conselho Nacional do Trabalho, com o objetivo de controlar o mercado e mediar relações entre empregadores e trabalhadores.


- Avanço da industrialização: o período viu o estímulo à indústria de base e à diversificação econômica, como forma de reduzir a dependência do setor agrícola e fomentar a urbanização e o crescimento das cidades.


- Emergência de novas forças políticas: partidos como a Ação Integralista Brasileira (de orientação fascista) e a Aliança Nacional Libertadora (de orientação comunista) começaram a se articular, evidenciando a polarização ideológica que marcaria os anos seguintes.



A economia brasileira no Governo Provisório de Vargas

 

Durante o Governo Provisório de Vargas, a economia brasileira passou por um processo de transição marcado pelo declínio do modelo agroexportador, especialmente da cafeicultura, e pelo início de uma política econômica mais intervencionista e nacionalista.


A crise mundial de 1929 havia provocado a queda drástica dos preços do café, principal produto da pauta de exportações do Brasil, levando o governo a adotar medidas de valorização artificial do produto, como a queima de estoques e a limitação da produção. Paralelamente, Vargas incentivou a industrialização como forma de diversificar a economia e reduzir a dependência externa, promovendo a substituição de importações e fortalecendo o parque industrial nacional, especialmente nos centros urbanos do Sudeste.


A nova reorientação econômica também se traduziu na criação de instituições e órgãos estatais voltados à regulação dos mercados e ao planejamento econômico, consolidando o papel do Estado como agente ativo no desenvolvimento econômico do país.



Como foi a transição para o Governo Constitucional?


A Revolução Constitucionalista de 1932 representou um ponto de inflexão na trajetória do Governo Provisório. Embora derrotado militarmente, o movimento paulista pressionou Vargas a dar início à transição prometida desde 1930. Em 1933, foram convocadas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, com a participação de diversos setores da sociedade, inclusive com a presença inédita de mulheres, que haviam conquistado o direito ao voto.


A nova Constituição foi promulgada em julho de 1934. Ela trouxe avanços significativos, como o voto secreto, o ensino primário obrigatório, a criação da Justiça Eleitoral e a consolidação de direitos trabalhistas. Vargas foi eleito presidente pela Assembleia Constituinte, de forma indireta, dando início ao Governo Constitucional (1934-1937). A transição marcou o fim do período provisório, mas manteve muitos dos elementos de centralização e autoritarismo que caracterizariam o restante da Era Vargas.

 

Passeata no centro da cidade de São Paulo em favor da Revolução Constitucionalista de 1932

Passeata, no centro da cidade de São Paulo, em favor da Revolução Constitucionalista de 1932.

 

 

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Por Jefferson Evandro Machado Ramos (graduado em História pela USP)

Publicado em 03/07/2025